O sol se pôs à duas horas. Fumo um
cigarro e vejo a fumaça dançar no escuro da varanda.
Lembrei do meu pai, da minha mãe. Não
os vejo faz tempo.
Desde que fui para o mar não tive
mais notícias. Aprendi a beber cedo. Cedo aprendi que há formas
diferentes de se afogar em terra.
De corpo fechado enfrentei as ondas,
tubarões e o canto das sereias. Da água salgada que salpica o corpo
já escuro, a pele que o sal do mar esfola e coça.
O sol vai embora e o vento noturo traz
o cheiro forte do sargaço e da decomposição marítima que é vida
também.
Lembrei dos barcos de papel a correrem
rua abaixo nos dias de chuva quando criança. Nas mãos ásperas de
papai a delicadeza da dobradura simples do barco, como se pelas suas
mãos fosse eu também a ser dobrado. Os barcos levados pra longe
pela chuva, nunca retornaram.
Eu também nunca retornei.