Ele fumava o cigarro, suas mãos
tremiam. Olhando para elas se deu conta do quão velho estava. À suas costas
estantes e prateleiras abarrotadas de livros nos mais diversos idiomas.Dava mais um trago e se
perguntava do que adiantava o conhecimento que tinha: saber ler em três
idiomas; confrontar as visões de mundo de Schopenhauer e Nietzsche; saber se, para
Camus, responder se o mundo tem três dimensões, se o espírito tem nove ou doze
categorias, não são tão fundamentais quanto responder a questão do suicídio.Um velho inteligente. Solitário,
como a maioria das pessoas que são muito inteligentes. Sabia que não passaria
daquela noite. Saboreou o cigarro como um último pedido. Só lhe tinham sobrado
os livros, tinha gastado tudo na última empreitada, em um trabalho que aceitara
quase de graça.Cobrava caro pelos seus serviços,
era um garoto quando começou a aceitar assassinatos por encomenda. De boa família,
culto, enfim, acima de qualquer suspeita. Matava políticos. Tinha uma foto
emoldurada na sala em que apertava a mão de Vargas. Acima de qualquer suspeita.Seu último serviço o havia
comprometido, sabia que subiam as escadas do seu prédio até a cobertura. Seu último
serviço, sabia. O fizera da forma mais deliciosamente bárbara e profana, do que
jamais fizera em todo os seus anos de trabalho.Fumava seu cigarro e aguardava
ansioso pela sua aposentadoria que subia a paços largos pela escadaria do prédio.Porta arrombada e um tiro seco,
silenciador. O corpo do velho em sua poltrona de leitura. Depois da chuva.
Nenhum comentário:
Postar um comentário