Olhava
meu esmalte gasto. Um vermelho que ia da base e se quebrava antes de
chegar às pontas das unhas. De certa forma me dava um prazer clandestino olhar
para eles.
Eu,
que não
era dada às grandes vaidades, me agarrava às pequenas com um afinco de quem se
segura ao colete salva-vidas. Livros e unhas pintadas. Minhas vaidades e prazeres
desnudos, para a todos chocar.
Ficava
linda para mim, desejava-me, paquerava-me sem me dar atenção nos cafés. Olhava a mim
mesma, linda, passando as páginas do livro com as unhas impecavelmente lindas.
Os olhos a fitarem por cima do livro, que me
cobria parte do rosto como
um véu a esconder os
lábios vermelhos, para o nada à procura
de ninguém.
Terminava
meus livros, quebrava meus esmaltes, descascando-os das unhas.
Minhas
pequenas vaidades, das quais me despia em casa, ficando nua das cores e das
palavras. Em casa não havia necessidade para elas, porque a vaidade pede os
olhos alheios, o desejo do outro. Guardava-me desses desejos sem avareza. Que os olhos
se contentassem com o que eu quisesse lhes dar de mim, eu era única e
exclusivamente minha.
Saia do banho e perfumava a nuca e os pulsos, só para
cair na poltrona e adormecer com o livro em fim acabado, contra meus seios, sob
as unhas nuas, me deixando à deriva de mim-mesma, sem coordenadas, esmaltes,
livros e olhares.