Leio
o livro ao sacolejar do ônibus. O calor escaldante de ventos quentes a entrar
pela janela do ônibus, suado.
Desço
para aguardar outro ônibus, livro na mão. O suor a escorrer na testa, gotas
grossas a deixar os cabelos levemente úmidos, logo secos pelo vento da avenida.
Entreguei
meus pontos, me sinto um derrotado, parado no calor do Recife, de mochila e
livro na mão a esperar o próximo ônibus. Sinto-me novamente um estrangeiro.
Sozinho.
Sozinho
pego o próximo ônibus, volto a folhear o livro, fantasiando as mais diversas
situações do meu cotidiano, como herói e vilão das coisas que me são alheias,
as quais o tempo se encarrega de levar embora à revelia dos meus desejos. Passo
pelas pontes, olho o rio escoltado pelas árvores de mangue. Que calor, um pingo
de suor cai da testa na lente interna dos meus óculos de aros redondos e nem me
dou ao trabalho de enxugar. Leio mesmo assim.
Orgulhoso
e derrotado, personagem do meu próprio cotidiano sentado à última cadeira do
ônibus vazio, com sede. Respiro e encontro a mim mesmo em um relance da Lavoura Arcaica, me animo, em um ânimo
triste de meio de tarde, um ânimo de quem vislumbra rápido que todos nós somos
feitos pra acabar.
Desço
em minha parada, encontro com as três
parcas no cruzamento da cidade universitária, aceno pra elas com a cabeça e
caminho pra casa. Caminho para subir os degraus do prédio, com uma leve quebra
de calor pela umidade das paredes.
Olho
a água cair gelada no copo de vidro, o cheiro da água gelada a afastar toda a
aridez da tarde. Ela doce a descer esfriando minha garganta enquanto sinto o
suor escorrer pela minha nuca, dos meus cabelos pesados e úmidos até o
colarinho branco da camisa.
Olhando
meu mundo particular, minha casa, minha acolhida, agradeço. Por todas as escolhas
erradas que fiz, por todo o mal que, dependente ou independente de mim, me
afligiu ou afligirá. Por que, de todo, o saldo tem sido bom, e eu tive a
oportunidade de fazer coisas boas, e mesmo disso a gente é feito pra acabar, um
dia.