Eram
dias de trovão. Tocava em seu carro uma velha fita k7 com músicas do Belle e Sebastian de um lado e do SteppenWolf do outro.
Cruzava
a cidade, com um velho amplificador na mala e o case da guitarra no banco de trás.
Um On the Road tupiniquim. Estava fugindo
de casa, um pouco tarde para sua idade. Fugia só.
Ele
sabia que as bombas cairiam em poucos anos, que deveria rumar país adentro, que
não era seguro estar no litoral quando as ondas encobrissem as primeiras
cidades costeiras.
Olhava
as pessoas andando distraídas, ocupadas em seu cotidiano, ao passar pelas
pequenas cidades, menores do que muitos bairros da sua própria cidade.
Eram
dias de trovão e ele sabia que anunciavam a catástrofe iminente. Sua viagem já
ia em 3 anos quando não teve mais de onde tirar dinheiro para seguir de carro.
Estava só e não tinha como recorrer à família, que o havia procurado por meses,
e que ainda passara um ano esperando algum contato de algum possível
sequestrador após as buscas da polícia terminarem.
Dois
anos após, encontrava-se vagando descalço, com os jeans rasgados tentando
escapar dos trovões e da chuva que o seguiam durante esses anos, sem deixa-lo
ver por mais do que poucos dias o sol. Às vezes sentia-se culpado pelas catástrofes,
causada pelas chuvas, das cidades pelas quais passara, só às vezes.
De
repente sentiu saudade de casa e resolveu voltar. Seu carro apodrecera em
ferrugem e mofo, deixado sem gasolina junto com o case vazio e um amplificar
queimado em uma beira de estrada, longe da rodovia à muitos anos.
Usava
um saco de lixo preto no corpo pra proteger os trapos da chuva e do frio.
Estava voltando pra casa. Se perguntava, como quem lembrava de algo perdido na
infância:
–
Quem é que ira lançar as bombas mesmo? Lembro de um cogumelo de fumaça.
Parava
um transeunte segurando-o forte pelo braço, a olhar o desespero do mesmo como
se fosse um assalto, e perguntava:
-
Filho, você viu a previsão de hoje? Falaram das ondas? Onde fica o litoral?
Sete
anos após chegou ao Recife. Magro, a barba em seu peito, um novo saco de lixo
preto, que trajava com uma elegância que ninguém percebia.
Esperou
um bonde que já se encontrava atrasado à décadas e saiu, a pé, escarnecendo a
cidade por não estar preparadas para
as...
-
Para o que mesmo? Tinha a ver com um cogumelo e ondas. Champignon? As ondas da
praia de Boa Viagem?
Coçou
a barba. Na verdade não parava de coçá-la. Foi ao marco zero. Chovia
torrencialmente, como não chovia em anos, com raios e trovões.
As
águas do cais estavam revoltas quando chegou. Então viu o que parecia ser um
cogumelo, grande demais para o seu gosto, e por trás dele as ondas a baterem no
quebra-mar.
Pegou
a primeira balsa de madeira, ignorando os gritos do barqueiro que levava
turistas ao quebra-mar parar visitar as esculturas do Brennad, e navegou por longos minutos sob forte chuva até conseguir
subir pelas pedras e abandonar a embarcação à deriva.
Sentia
as ondas baterem no quebra-mar e o molharem mais do que a própria chuva. Olhou
o monumento fálico sob o céu plúmbeo. Ondas e mais ondas a baterem nas pedras.
Juntou-se
ao mar.
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