sábado, dezembro 31, 2011

Nos vemos em 2012

Fim-de-ano a poucas horas de vir.
O Tardes Quentes de Outono deseja um ano novo com muita paz para todos.
Obrigado a todos os que deixaram um pouquinho de si por aqui, esse blog é para vocês.

Abraços carinhosos

terça-feira, dezembro 06, 2011

Recife de lembranças



Trilha Sonora:
As ruas do Recife me lembram Dublinenses...
Dos prédios altos do centro por onde a luz do sol se infiltra criando aquela bolha de calor que se mistura aos cheiros do que escorre pelos bueiros, caminho me atrevendo, de vez em quando, a olhar para o alto e imaginar as histórias por trás de cada janela dos prédios antigos que levam a uma das pontes que cruzam o Capibaribe.
Milhares de pessoas e suas histórias pessoais se cruzam na Boa Vista... eu no meio. No meio de histórias que são um pouco minhas também, de sofrimentos e alegrias que não são meus.
Sentado ao píer do marco-zero defronte ao monumento fálico de Brennand, olho o navio ancorado perto dos armazéns, enquanto o vento assanha ainda mais meus cabelos... um terral que precede o chover. Já vi alguns sois nascerem por lá antes de percorrer as pontes e pegar o ônibus pra casa, cantarolando uma música ou outra.
Caminho pelas ruas de Casa Forte com meu irmão, revejo meu nome na Madalena e passo algumas noites na Cidade Universitária. Observo tudo com um ar de novidade, por vezes com uma sensação de estranheza do mundo, como caminhar pelo MASP, pelo mercado público de Porto Alegre ou alguma praia de Natal. Tudo novo de novo.
Sento em um dos bancos em frente ao lago da universidade federal e como pipoca, rindo das bobagens da vida cotidiana, nostálgico das minhas histórias, pequenos pedaços compartilhados com os amigos: aquela volta pra casa, com o carro cheio, cantando Belle e Sebastian com Carol; à tarde desenhando o livrinho infantil com minha esposa, Lula e Thais; as conversas na livraria cultura com Marcinha; aquela internação de urgência que fiz com Silvinha e que rendeu boas risadas depois de todo o sufoco; as noites por vezes solitárias no recife antigo madrugada adentro passadas pelos lugarzinhos undergrounds que hoje já não existem; o fim de festa no Garagem; as sessões de cinema francês da Fundaj discutidas posteriormente com Renatinha e Pepel... minha rede na varanda e os aviões que teimam em sobrevoar meu prédio.
Por vezes me perco em minhas memórias só para depois me surpreender ao me encontrar nas linhas que escrevo.



sexta-feira, novembro 04, 2011

A bicicleta




Era velha, caloi vermelha parecida com uma monareta. Tinta riscada.
Mas me levava pelo mundo afora, pelas ladeiras de paralelepípedo, de vez em quando fugindo de algum cachorro, de vez em quando empurrando quando furava a câmara de ar do pneu.
Das tardes quentes que passava na casa do meu avô, sobram lembranças amareladas, com cheiro de terra seca levada pelo vento. A bicicleta encostada a convidar um passeio por Pernambuco, ou pelo corredor de caraibeiras da rua que dava na igreja de São Francisco, forrando o chão de amarelo, nas mesmas tardes em que o calor traz toda aquela moleza, um entorpecimento gostoso que só é afastado pelas gotas de suor que brotam no rosto.
Poucos cruzeiros no bolso e o mundo todo aos meus pés.
Uma volta no quarteirão era o bastante para trazer notícias de terras distantes, enfrentar os maiores desafios, fugir de alguns cachorros e chegar a tempo para lanchar e receber carinhos da família.
Tomo mais um gole de café na varanda de casa, respiro fundo... é manhã, o sol ainda a se levantar preguiçoso. Lembro de uma música que meu amigo escreveu sobre uma bicicleta. Acabo por passar o dia cantarolando ela, só pra ir deitar ao fim do dia cansado... bocejando, falando com meus botões: é.. acho que vou comprar uma bicicleta... isso... vou comprar... vou... Zzz  


Veja só - Castor Luiz

domingo, outubro 23, 2011

O gato



Que ele atravessava os umbrais das casas era bem verdade. Negro à noite, cinzento ao amanhecer e cor de cobre, ahhh cor de cobre, ao entardecer.
O gato era senhor de seus territórios. Às vezes de alguns humanos.
Se perguntassem seu nome, poderia dizer desdenhosamente que não tinha um, que somente criaturas ignorantes precisariam de nomes para saber quem são. Ele era simplesmente ele.
O gato certa vez, ao atravessar a soleira de uma porta (que para os gatos podem ser as mais diversas), havia encontrado uma pequena criança ao entrar no limiar. O limiar era extenso, e não era raro encontrar as mais diversas coisas ao passar por ele.
Ela particularmente cruzava o limiar a muito tempo, tempo suficiente para não se surpreender com as coisas que via por lá antes de chegar ao próximo umbral, geralmente de alguma casa velha. As casas velhas possuíam as melhores entrada para o limiar.
Vez por outra o limiar costumava sugar coisas frágeis para si, o gato sabia bem. Mas uma criança era tão rara naquelas instâncias quanto encontrar algum deus antigo em meio à metrópole.
Seu pelo ia de cobre a negro quando voltou à velha casa apodrecida do bairro. Precisou esperar um pouco até os jovens, que se drogavam do lado de dentro do muro baixo, saírem antes de passar a soleira e caminhar até o quarto da avó, sentada na poltrona mofada a espera de algo que já não se lembrava mesmo quando era viva.
Avó – falou o gato, pondo um filhote de camundongo no chão, fitando os buracos escuros do que já haviam sido olhos castanhos reais. Não falou mais nada.
Ela ajeitou os cabelos, cujos fios teimavam em alçar vôo, como quando se está em baixo d’água e os cabelos tomam vida própria. Explicou-lhe que houvera uma época em que milhares de crianças freqüentavam o limiar, muito tempo atrás.
Contou que elas não precisavam das soleiras, as quais as demais criaturas usavam rusticamente para tal função. Cabia a elas o desbravamento do limiar, mesmo que por um curto período de tempo, antes de precisarem de um nome para se reconhecer.
Por isso não nos lembramos do que se passa antes dos dois anos- sorriu a avó mostrando os dois únicos dentes inferiores e protuberantes na gengiva. Hoje, meu filho, elas passam pelo limiar sem perceber, provavelmente você não a verá nunca mais- sorriu novamente.
A cauda fina do filhote se contorcia em sua boca, enquanto ele abocanhava o que sobrara de seu corpo, sempre a fitar a avó.
Esse será mais um segredo para você- disse em sua voz rouca a apontar o dedo em sua direção.
O gato tinha uma coleção de segredos, como tinha a maioria dos de sua espécie. Na verdade sua espécie era feita do mesmo material dos segredos, daí sua furtividade.
Cruzando a soleira seguinte apareceu no parque, bem ao longe de onde os mendigos costumavam dormir. Ele reconhecia bem o lugar, um dos poucos onde havia um parlamento das árvores, cada vez mais raros, mais raro até do que crianças pequenas no limiar. Havia outros gatos, também chamados ao parlamento.
Caminhou por entre as árvores, cansadas, longe do esplendor que costumavam passar em tempo idos. Não era de sentir pena.
Algo estava para acontecer, mais e mais gatos chegavam a pequena clareira circundada pelo parlamento.
Esticou-se desconfiado. De súbito correu em direção ao enorme tronco do que havia sido de uma jaqueira antiga. Cruzou a raiz exposta que formava uma meia-lua na grama e sumiu.

sexta-feira, setembro 23, 2011

sobre a efemeridade da coisa

 Arquivo pessoal
Pronto. Escapou.
A coisa vem me escapando direto. Quanto mais me aproximo, mais se distancia. Mas.
Mas a coisa é que... é que não consigo escrever.
Mudo as ordens das estruturas aqui, adicionando e cortando informações desnecessárias. Tudo pretexto para o surgir da vontade de escrever, nem que seja para escrever sobre o não ter do que escrever. Essa coisa.
Mudo um livro, adiciono novos músicos, leio o e-mail do amigo que não vejo a muito tempo. Não consigo escrever o fim daqueles capítulos, de uma história que ainda nem sei o nome. Essa coisa.
Essa coisa de usar pseudônimo a anos, amadurecendo em cima de escritas que só vou entender anos depois. Anos depois a ver o quanto jovem era, ao brincar de escrever sobre o que as palavras não dão conta. Dessa coisa.
Essa coisa que encontro o tempo todo, nas entrelinhas desse monólogo sem sentido, e que nunca consigo tocar.

sábado, agosto 20, 2011

Cap III: Do encontro com a criatura e seus olhos negros



Já faziam algumas horas de sua empreitada na parte proíba do vilarejo. Na verdade já faziam mais de um dia. Pés cansados e mãos cortadas dos espinhos e das pedras ásperas das encostas que davam para o abismo.
Meio-dia, pausa para comer alguma coisa. Sozinho na vegetação árida, sob a sombra da árvore retorcida.
Sua cabeça viajava por mundos e histórias distantes, nem percebera o pequeno diabinho que saia das sombras do arbusto. Fumava um cachimbo de madeira e tinha pernas peludas e arqueadas para trás.
Cumprimentou-o em meio a fumaça espeça do cachimbo, lhe oferecendo diversas barganhas em troca de sua alma.
Fora o único em muito tempo que lhe dirigia palavras com cortesia.
Passaram a tarde conversando, por fim, o diabinho também havia tempo que não tinha alguém para conversar, além das larvas e dos outros animais peçonhentos.
O mormaço trazia uma certa moleza, e ele parava por vezes à fitar os olhos da criatura. Negros, fundos. A fumaça  a lhe encobrir a vista.
Eram os momentos que mais esperava, quando a fumaça dissipava e podia fitar os olhos da criatura.
Via a si mesmo neles.

domingo, agosto 14, 2011

Ando meio desligado


 (Arquivo pessoal)

Uma breve pausa para dar conta da vida enquanto não descubro o final dos próximos capítulos.
Preciso descansar.






domingo, julho 24, 2011

Cap II: De uma madrugada inteira à luz de velas e a busca pelas lembranças perdidas


 
Folheava as páginas à luz do lampião de gás. Sua casa na vila dos operários ainda não possuía luz elétrica, mas ele não ligava muito. Passou quase a noite toda a ler o livro em português antigo. Era fim-de-semana, ninguém o incomodaria, não recebia visitas de ninguém, fora os dias de trabalho.
Procurava nas entrelinhas do livro coisas sobre si. Não havia familiares para tal função. A sua mãe morrera ainda cedo, seu pai no fim da era das grandes construções das barragens da vila, antes de lhe ensinar tudo sobre o oficio que hoje era seu. As vezes tinha impressão de que todos eram escravos das grandes construções, como se vivessem somente para alimentar os maquinários das usinas, sedentas de calor, água e óleo.

Havia um capítulo  que contava a historia dos primeiro habitantes da vila, índios. Mortos décadas após a chegada dos colonizadores. A água turva da vila era consequência da morte deles e os poucos descendentes miscigenados eram vistos como mau agouro. Sua avó era descendente direta da água turva hoje represada. Nas noites quentes de agosto ela contava história sobre deuses da floresta e da água. Como poderia ter esquecido? Quantas lembranças haviam adormecidas em si, após longos anos de trabalho sem nenhum questionamento? Quantas haveriam de surgir, linha após linha, daquele livro dos segredos?
Fez um cigarro e acendeu. Mente vazia. Sentou-se no banco à porta da casa de alvenaria no bairro dos operários. O lampião da porta já fraco pela luminosidade que anunciava o novo dia. Mente vazia, atenção voltada apenas para os círculos de fumaça a saírem do cigarro de palha.

Havia um mapa antigo da vila, que continha a área dos paredões rochosos que protegiam o rio turvo. A parte proibida da vila. Pela primeira vez sentia algo expandir-se dentro de si, um comichão que se transformava em uma agonia silenciosa. Seu corpo adormecido pela falta de expectativas tremia.  O coração de operário começava a bater fora do compasso das engrenagens.

Alguns chegaram a ouvir alguém descer o bairro ofegante as cinco horas da manhã. Se perguntassem a eles quem poderia ser, com certeza não saberiam, mas diriam que parecia desespero. Os passos foram ouvidos por toda a extensão da rua naquela madrugada, deixando para trás uma pequena casa de alvenaria com um cigarro a queimar no banco e um lampião prestes a apagar.

domingo, julho 17, 2011

Cap. I: Sobre o encontro inusitado e a fuga para casa no bairro dos operários

 
Era sobre a história de seus passados que ele pesquisava na biblioteca municipal. Lá havia uma sessão só sobre as famílias que criaram o povoado quando das construções das enormes usinas.
Esperava encontrar um livro que falasse dele mesmo, da sensação que lhe assobiava aos ouvidos durante as tardes. As mesmas tardes áridas e quentes dos últimos dois anos que assolavam as prateleiras de livros empoeirados que o velho ventilador se encarregava de espalhar. Tinha encontrado um livro sem capa escondido em uma das prateleiras afastadas. Era escrito a mão, bastante velho. Trazia historias do folclore e das superstições da população ribeirinha, datada da época da colonização de sua terra.
Fora escrito para ele. Suas palavras dirigiam-se para ele, como se para alertar do perigo de saber. Saber, naquela cidade, era se arriscar demais, era por em riscos os segredos e as proteções de gerações antes dele. O velho livro era um sobrevivente da inquisição da vila, que não ficara louco ou desacreditado no passar das décadas.
Dentre todos os tratados da cidade, de sua fundação as relações genealógicas de seus moradores em quinze gerações ou mais, foi justamente um livro de superstições que poderia lhe dar um pouco do que procurava: o mito de si-mesmo.
Nem fora percebido ao passar pelo balcão de atendimento da biblioteca ao final daquela tarde de outubro, com o livro por baixo do casaco. Fora visto por muito poucos andando apressado e visivelmente excitado em direção ao antigo bairro dos operários ao cair da noite.
Havia tanto a saber sobre si mesmo.

sábado, junho 18, 2011

Expanção


Belle and Sebastian - Wrapped Up In Books


É sábado, está chovendo.

A luz se infiltra pela janela do quarto que transformei em escritório, do armário embutido cheio de livros e papéis, gavetas de lembranças fotográficas. Quinta foi o bloom’s Day.

Ganho tempo pra escrever enquanto ela põe o despertador na soneca de dez em dez minutos antes de ir para a faculdade. Ombros cansados, noite cheia de sonhos.

É sábado de manhã. Está chovendo. Céu cinza por detrás do prédio em frente ao meu, e uma pequena sensação de frio que deixa mais gostoso escutar Wrapped Up In Books.

É como estar em expansão, essa sensação. A mesma que tinha quando mais jovem ao escrever na folha de papel ouvindo a velha fita k7 no walkman amarelo.

Minhas aspirações estão dentro dos livros que leio como marca-páginas, minhas inclinações escondidas pelos olhares.

Aspirações que enchem as prateleiras, indo de Charlie Schulz a Shopenhauer, de Gaiman a Dickens. Nas páginas que leio, que folheio, nas quais me perco só para me achar quando escrevo.

É sábado. Está chovendo.

Não poderia ser mais maravilhoso.

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