terça-feira, janeiro 11, 2011

(Des)Conversa



- Calma, já passou.

- Mas ta doendo!

- Deixa ver aqui. É só pancada na canela, já já passa.

- Passa nada, ta doendo pra burro. Tem gelo?

- Não. Tem chave de fenda. Serve?

- Pra bater prego? Tem que ter cola senhor.

- Toma aqui dois, me volta um e meio e mais aquele passarinho. Pode ser?

- Só se me vier três e eu devolver canário e água.

- Fechado. A propósito, como está sua canela?

- Melhor do que o seu juízo.

sábado, janeiro 08, 2011

Correndo com tesouras

A vida à tarde toma um outro sabor. Às vezes à tarde os sabores se tomam de vida.

Relógio corre, antes das 10 já fez metade do que deveria fazer, ou pelo menos do que estaria marcado em sua agenda. Ele agenda os imprevistos. Estou correndo com tesouras.

Seus amigos continuam jovens enquanto envelhece ao sabor dos ponteiros, nem pode descansar pois fizeram um ninho em sua rede enrolada na parede.

Que surpresa, um ninho! Se ele não descansava pelo menos tinha alguém a usufruir a rede que seu pai havia ganhado de presente no dia de sua aposentadoria. Ficou com medo de mexer nele, ou de levar para alguma arvore por ai. Na verdade o ninho lhe lembrava seu antigo pinheiro, que acolhia diversos ninhos nos dias de janeiro.

Hoje não tem mais pinheiros, só as árvores em flor que tecem o caminho do canal do cavouco de carmim pelo qual passa com seu carro geralmente 10 quilômetros mais rápido que o permitido quando não há transeuntes. Poderia ter sido bombeiro, com certeza apagaria menos incêndios do que agora, mas era gordinho. Poderia ter sido artista a cantar, desenhar e escrever as mazelas e conquistas da vida, mas tinha que ganhar dinheiro.

Hoje ele entende o que Camus queria dizer, sobre transformar a vida em tragédia para dar sentido ao absurdo de existir, quando aos vinte e dois (?) não fazia a mínima idéia que tragédias poderiam servir para algo além do sofrimento. Suas tragédias não são gregas, não precisa furar os olhos, lutar contra esfinges. Ele decifra os enigmas do mundo enquanto corre no carro ouvindo Otto, Belle & Sebastian, ou qualquer outra música que toque no rádio, no ínterim de seus locais de trabalho, enfrenta as intempéries da vida de casal, das contas pra pagar, das desculpas por se atrasar para o jantar por estar trabalhando, suas epifanias não surgem dos embates com as Fúrias, mas da conversa sobre Clarice Lispector, Mafalda e Peanuts ao fim do expedientes.

As tragédias hipermodernas não precisam terminar em cavernas. Pra mim já basta aquele barzinho com as pessoas queridas a rir da vida e de nossas pequenas tragédias.

Estou correndo com tesouras. Rindo, ao sabor do vento. Tomando cuidado para não tropeçar.

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...

Quem procura...